O descontentamento humano é bem nosso conhecido apesar de não podermos precisar quando surgiu ou se sempre existiu, tão longínquo e difuso é o relato do período anterior à famosa expulsão do paraíso.
Assumimos o descontentamento como característica que, ainda que catalogada como negativa, aparenta ter a sua cota parte de importância na força que move a engrenagem. Essa força é vulgarmente chamada de “sonho” e, despertos ou adormecidos, entre o mentalmente ordenado e a desordem de sensações, uns por si e outros movendo montanhas foi-se desenhando a história daquilo que é humano.
Ingenuamente ou conscientemente, esperançadamente ou friamente, não se descobriu ainda um ser humano que nunca tenha sonhado durante a sua existência. Normal será então pensar que alguém descontente procura sonhar. Mas a linearidade já passou à história, e os filtros mentais para lá caminham, deixando a simplicidade num beco sem saída. Estamos na era do eterno descontentamento. Antes de ver um sonho realizado deseja-se outro e outro, sem prestar qualquer atenção às realizações dos mesmos. Deste modo perde-se o verdadeiro sonho e o descontentamento dá lugar a outro descontentamento disfarçado de sonho.
Há até quem pense que a alma, definição vaga de algo que permanece, não passa de descontentamento puro.
Imaginemos que, de dia ou de noite, enquanto sonhamos com algo que desejamos ouvimos um zumbido que parece ser o de um mosquito que nos interrompe o sono…
Depressa e sem hesitar ou abrir os olhos, arremessamos a primeira almofada que nos vier à mão num tiro certeiro para calar este ser que nos importuna.
Não paramos nem para ver o que era nem para parar de sonhar.
Seguimos sonhando e saboreando o nosso conforto com um leve sorriso até ao despertar.
Mas o que nunca chegámos a sonhar foi que aquele presumível mosquito poderia tratar-se de uma minúscula fadinha… que apenas estava ali por termos em nossa mente criado um belo sonho que ela vinha, alegremente e para nosso próprio contentamento, finalmente realizar…
Sonhar é saber voar e planar vencendo o atrito deste mesmo ar.